Responsabilidade civil pela usurpação indevida do tempo livre

Responsabilidade civil pela usurpação indevida do tempo livre

Responsabilidade civil pela usurpação indevida do tempo livre

Dizem que tempo é dinheiro, além de ser o senhor de todas as coisas. No entanto, o que pouca gente sabe é que o ensinamento dos ditos populares também pode valer para a justiça brasileira.

 

Para tentar livrar o consumidor do assédio comercial, estresse por contatos excessivos, bem como limitar as ligações dos operadores de telemarketing sobre a venda de produtos, cobranças e outros serviços, o Senado Federal aprovou um projeto para que essas ligações sejam, além de regulamentadas, limitadas.

 

De acordo com a proposta, o fornecedor que entrar em contato com o consumidor deverá, antes de mais nada, dispor de uma tecla para que ele, se assim, desejar, interrompa a chamada logo em seu início. Além disso, as novas regras também proíbem o uso de números por parte das empresas operadoras de telemarketing que não possam receber ligações de retorno, além de estabelecer um limite para o horário em que essas chamadas são efetuadas.

 

Para Pablo Stolze, mestre em Direito Civil e juiz do Tribunal de Justiça da Bahia, que integra o time de docentes da LFG, a questão é mais ampla. “Se seu carro, seu imóvel, seu dinheiro tem valor jurídico, por que seu tempo não o teria?”, indaga.

 

O professor complementa com a informação de que os tribunais já começaram a aceitar – em caso de abuso comprovado, a chamada “responsabilidade civil pela perda de tempo livre do consumidor”. O autor da tese, Marcos Dessaune, utiliza a expressão “desvio produtivo do consumidor”.

 

E Dessaune dá alguns exemplos:

 

“Enfrentar uma fila demorada na agência bancária em que, dos 10 guichês existentes, só há dois ou três abertos para atendimento ao público; ter que retornar à loja (quando ao se é direcionado à assistência técnica autorizada ou ao fabricante) para reclamar de um produto eletroeletrônico que já apresenta problema alguns dias ou semanas depois de comprado; telefonar insistentemente para o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) de uma empresa, contando a mesma história várias vezes, para tentar cancelar um serviço indesejado ou uma cobrança indevida ou mesmo para pedir novas providências acerca de um produto ou serviço defeituoso renitente, mas repetidamente negligenciado” .

Em verdade, de acordo com professor Pablo Stolze, diversas são as situações de dano apontadas por Dessaune, merecendo destaque uma delas, que ilustra, com as nítidas cores da perfeição, o intolerável abuso de que é vítima o consumidor, obrigado a “esperar em casa, sem hora marcada, pela entrega de um produto novo, pelo profissional que vem fazer um orçamento ou um reparo, ou mesmo por um técnico que precisa voltar para fazer o conserto mal feito” .

Como comprovar que foi lesado

 

Corriqueiramente acontece a seguinte cena em centrais de atendimento: você liga para solicitar um serviço ou produto. Ao agendar um horário para visita técnica, por exemplo, se depara com a seguinte informação:

 

“o técnico irá em horário comercial”. Neste caso tão comum, além de perder o dia todo esperando a chegada do profissional, o consumidor é privado de sua própria vida, bem como do contato com sua família ou mesmo de um dia de trabalho. Situações como essa, dependendo do caso e desde que haja dano e prova do abuso, pode caracterizar a responsabilidade pela perda do tempo livre.

 

Vale dizer, não é somente pelo fato de ter havido uma espera que se pode ser indenizado, tudo dependerá da análise do caso. Você pode, por exemplo, justificadamente, passar algumas horas no banco, para ajustar um financiamento de um imóvel. Mas não se justifica, em tese, uma espera dessa natureza, para pagar uma simples conta de luz…

 

 

Dano existencial e a quem recorrer

 

De acordo com professor Stolze, a usurpação indevida do tempo livre traduz o que a doutrina denomina de “dano existencial”. “É existencial porque compromete a qualidade de vida da pessoa, privando-a injustamente daquilo que gosta e poderia fazer”.

 

E complementa: “Atualmente, tenho a impressão de que as 24 horas do dia não suprem mais – infelizmente – as nossas necessidades. E, se por um lado, esta falta de tempo para viver bem é algo trágico em nossa sociedade – e que merece uma autorreflexão crítica – por outro, é forçoso convir que as circunstâncias do nosso cotidiano impõem um aproveitamento adequado do tempo de que dispomos, sob pena de experimentarmos prejuízos de variada ordem, quer seja nas próprias relações pessoais, quer seja nos âmbitos profissional e financeiro”, complementa.

 

No caso de o consumidor se sentir lesado por ter seu tempo tomado por quaisquer questões similares às acima citadas, a situação deve ser levada a um advogado ou a um defensor público. No entanto, o professor Stolze afirma que é muito difícil saber a forma de fixar a indenização.

 

“Não existe uma tabela que mostre o valor e, desta forma, o juiz arbitra conforme as condições do caso”. Por fim, vale observar ainda sobre o tema, que o Direito Contemporâneo tem se voltado para questões existenciais muito relevantes que, no passado, não despertavam a devida atenção”, explica o professor.

 

Aproveito para fazer um convite para os nossos amigos do Blog do LFG. Quem quiser assistir uma entrevista nossa sobre o tema, que fiz para a TV Globo, basta acessar ao link, finaliza o professor.

 

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