Tratamento estético: responsabilidade civil do médico em caso de danos

Tratamento estético: responsabilidade civil do médico em caso de danos

 

Flávia Lucas Gomes e Cesar Peghini*

 

A integridade física é um direito da personalidade. Logo, é natural que haja um tratamento diferenciado quando estamos diante de uma violação a este direito. O dano no tratamento estético está compreendido no dano ao corpo.

 

O presente artigo será estruturado de forma lógica para que se chegue a uma correta conclusão a que tipo de responsabilidade o médico cirurgião tenha caso ocorra um dano estético em um paciente.

De início, será abordado os elementos da responsabilidade civil, seguindo-se com enfoque ao dano. Após, segue-se com considerações no tocante ao tratamento estético e suas modalidades. Por fim, será abordada diretamente a responsabilidade civil do médico.

A natureza jurídica da relação médico-paciente, sendo contratual ou extracontratual e a obrigação assumida nos dois tipos de tratamento é abordada de maneira que fique clara o desdobramento lógico da responsabilização do médico.

 

 

1. Responsabilidade civil

 

 

1.1 Conceito

Sérgio Cavalieri Filho, entende que a responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo, fazendo distinção entre obrigação e responsabilidade. Para ele, obrigação é um dever jurídico originário, logo, caso haja o seu descumprimento, nascerá um dever jurídico sucessivo, que seria a responsabilidade.[1]

O nascedouro da responsabilidade civil era o ato ilícito, o que já foi superado, pois também há a responsabilidade civil decorrente de ato lícito. Já para Flávio Tartuce:

 

“A responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar determinada pessoa de observar um preceito normativo que regula a vida”.[2]

Do conceito acima, extraímos a responsabilidade civil contratual e extracontratual. Superado o conceito, necessário é o estudo pormenorizado dos seus pressupostos.

 

 

1.2 Elementos da responsabilidade civil

A responsabilidade civil encontra a sua base fundamental no artigo 186 do Código Civil de 2002. O ato ilícito é uma das formas que geram a responsabilidade civil.

Para que haja a sua caracterização, necessário se faz o estudo dos seus elementos, substâncias primordiais ou chamados pressupostos do dever de indenizar. Prevalece na doutrina os quatro elementos ou pressupostos do dever de indenizar. São eles: conduta humana (ação ou omissão), culpa lato sensu, nexo de causalidade e dano.

A conduta humana é composta por uma conduta positiva (ação) ou conduta negativa (omissão) voluntária, que, neste caso, irá desembocar na responsabilidade civil por haver causado um dano a outrem.

Maria Helena Diniz conceitua ação como: “(…) o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.[3]

A regra acaba por ser uma conduta positiva, onde o agente voluntariamente realiza o ato. Neste caso, o agente responde por seu ato e ainda, pode responder por ato de terceiro, conforme preceitua o artigo 932 do Código Civil. Em sendo uma conduta omissiva, se faz necessário a presença do dever jurídico de praticar um certo ato, conforme leciona Carlos Roberto Gonçalves.[4]

A culpa por sua vez, também possui seus elementos. No Direito Civil, diferente de outras áreas, abrange em si a culpa (stricto sensu) e o dolo.

O dolo é a intenção, vontade de praticar ou deixar de praticar determinada conduta voluntariamente. Seria o caso descrito no artigo 186 do Código Civil “ação ou omissão voluntária”.

 

Para Flávio Tartuce, para a fixação da indenização deve ser observado o grau de culpa dos envolvidos, ou seja, se ação foi realizada com dolo, a reparação deve ser integral.[5] Já Silvio de Salvo Venosa aponta que para efeito de indenização, o que deve ser levado em conta é o efetivo prejuízo.[6]

Na culpa stricto sensu não existe a intenção de não observância deliberada de um determinado preceito. Essa violação acaba ocorrendo por uma conduta diversa. Para Flávio Tartuce:

 

“A culpa pode ser conceituada como sendo o desrespeito a um dever preexistente, não havendo propriamente uma intenção de violar o dever jurídico, que acaba sendo violado por outro tipo de conduta”.[7]

A culpa stricto sensu é relacionada a três modelos jurídicos, a saber: a negligência, imprudência e imperícia. Quanto à natureza, a culpa pode ser classificada como contratual, que engloba por sua vez a culpa em contratar e contrahendo, e extracontratual, também chamada aquiliana.

 

Culpa contratual, diz-se aquela decorrente de uma infração de cláusulas ou acordos firmados por qualquer das partes através de um contrato. Já a culpa extracontratual ou aquiliana, advêm da não observância a um dever fundado no ordenamento jurídico.

Quanto ao nexo de causalidade temos que, para que seja caracterizada a responsabilidade civil, é imprescindível que haja um elo de ligação entre a conduta e o dano. A este elo dá-se o nome de nexo de causalidade. Este vínculo demonstra a causa e a consequência, o que possibilita aferir um dos pressupostos da responsabilidade Civil.

Importante salientar que o dano não obrigatoriamente estará diretamente ligado ao evento danoso. O dano pode ocorrer de forma indireta. Necessário é a prova de que sem a conduta lesante, o dano ocorreria.

Vale destacar ainda que, mesmo caracterizado o nexo de causalidade, há fatores que podem romper esse elo. Grande parte da doutrina aponta como excludentes: culpa exclusiva da vítima, culpa exclusiva de terceiro e o caso fortuito e a força maior.

Por último temos o dano, elemento este que encontra várias vertentes. O dano nada mais é do que uma lesão, que se dá de diversas formas.

 

O dano figura como elemento essencial da responsabilidade civil contratual ou extracontratual, uma vez que, se não há um dano a se reparar, não há que se falar em responsabilidade civil. Silvio de Salvo Venosa conceitua dano como “o prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico.”[8]

Não basta apenas a ocorrência do dano, ele deve ser também indenizável. O dano ou prejuízo pode ser classificado como patrimonial ou extrapatrimonial.

O dano patrimonial se dá quando o patrimônio do ofendido sofre lesão, seja através da efetiva perda de patrimônio (dano emergente), ou do não aferimento de lucro razoável (lucros cessantes), conforme leciona Maria Helena Diniz. [9]

O dano moral ou extrapatrimonial se dá com a lesão aos direitos da personalidade. Embora tenha havido grande discussão em torno da possibilidade da sua reparação, esta já foi superada com o advento da Constituição de 1988.

Em sequência temos o dano estético. Para Nehemias Domingos de Melo, o dano estético “corresponde a qualquer anomalia que a vítima passe a ostentar no seu aspecto físico, decorrente de agressão à sua integridade pessoal. ”[10]

O Código Civil assim dispõe: “Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.” Trata-se aqui de uma forma indireta de reparação.

 

 

2. Dano em tratamento estético

Em uma cultura como a nossa, onde se supervaloriza e cultua determinados padrões de beleza, um dano no tratamento estético pode acarretar graves danos à vítima, principalmente no campo psicológico, pois a vítima terá um sentimento de exclusão.

Quando esse dano se dá decorrente de tratamento estético, ele ganha maiores proporções, uma vez que esses tratamentos atualmente acabaram ganhando papel importante na formação da identidade de determinados pacientes.

A Súmula nº 387 do Superior Tribunal de Justiça afirma a possibilidade da cumulação do dano em tratamento estético com os demais. Neste sentido, Genival Veloso de França além de o conceituar, faz alguns apontamentos no tocante a dificuldade quanto a sua avaliação prática, uma vez que possui em seu bojo alguns valores subjetivos. Em suas palavras:

Pode-se definir o dano estético como um prejuízo na harmonia e na aparência de alguém capaz de chamar a atenção de um terceiro observador. Sua avaliação é uma prática de muita complexidade dentro da quantificação do dano corporal pois requer não apenas uma metodologia de cunho científico, mas também a consideração de uma série de valores subjetivos e existenciais. [11]

Teresa Ancona Lopez, aponta a conceituação, e mais, traz para discussão um ponto essencial no tocante a relatividade do que se entende por belo, pois o conceito do mesmo pode, e muda, de pessoa para pessoa.[12] Vale destacar que dano em tratamento estético não é configurado por qualquer lesão, pois, para que haja o dever de indenizar há que se falar em uma deformação ou mutilação.

O referido dano possui elementos caracterizadores. Quanto aos elementos que compõem o compõe em matéria de Direito Civil, Teresa Ancona Lopez aponta a existência de quatro elementos, quais sejam: qualquer modificação / transformação (lesão), permanência, modificação na aparência externa da pessoa, e por último, o “enfeiamento” da vítima.

 

Muita complexidade dentro da quantificação do dano corporal pois requer não apenas uma metodologia de cunho científico, mas também a consideração de uma série de valores subjetivos e existenciais. [11]

Teresa Ancona Lopez, aponta a conceituação, e mais, traz para discussão um ponto essencial no tocante a relatividade do que se entende por belo, pois o conceito do mesmo pode, e muda, de pessoa para pessoa.[12]

Vale destacar que dano em tratamento estético não é configurado por qualquer lesão, pois, para que haja o dever de indenizar há que se falar em uma deformação ou mutilação.

O referido dano possui elementos caracterizadores. Quanto aos elementos que compõem o compõe em matéria de Direito Civil, Teresa Ancona Lopez aponta a existência de quatro elementos, quais sejam: qualquer modificação / transformação (lesão), permanência, modificação na aparência externa da pessoa, e por último, o “enfeiamento” da vítima.

 

No terceiro elemento, temos a exigência de que a lesão seja na aparência externa da pessoa. Para Teresa Ancona Lopez, a exigência não é a visibilidade da deformação, mas sim a sua existência no corpo. Não seria plausível exigir que a deformidade permaneça a vista dos outros, o que agravaria mais a situação do indivíduo que possui o dano.[16]

Por fim, temos o “enfeiamento” da vítima. Logo, não basta ter havido uma modificação na aparência externa. É necessário também que está modificação seja para pior. Este último elemento, é tratado por Genival Veloso como prejuízo estético:

Por prejuízo estético, uma alteração morfológica que pode chamar a atenção, mas sem causar maior vexame ou repulsa. Deformidade quando existe uma alteração grave da conformação humana, cuja modificação lhe acarreta o “enfeamento”, traduzindo humilhação e desgosto. E aleijão como uma coisa horripilante, repulsiva, que causa asco, repugnância ou humilhação.[17]

Diante dos elementos configuradores do dano em tratamento estético, é natural concluir que ele acaba por desaguar em um dano moral, o que acarreta a sua cumulação muitas vezes com o dano patrimonial.

 

 

3. Tratamento estético

O tratamento estético é gênero, do qual decorrem inúmeras espécies, como por exemplo, a cirurgia plástica. No tocante ao objetivo, especificamente na cirurgia plástica Arnaldo Rizzardo aponta que ela “(…) busca-se reparar ou corrigir um defeito corporal, com a finalidade de recuperar ou melhorar a aparência do corpo humano.”[18]

Os referidos tratamentos apresentam duas grandes vertentes, pois a intervenção para modificar o corpo pode ocorrer por razões médicas, o chamado tratamento estético reparador, ou por razões meramente estéticas, chamado de tratamento estético embelezador.

O tratamento estético reparador, ou corretiva, tem por objeto a correção de determinada deformidade física, seja ela advinda desde o nascimento ou que tenha ocorrido no decorrer da vida por algum acidente.

É indiscutível a importância da existência do referido tratamento para a vida das pessoas. Ele é um mecanismo que possibilita a inclusão do indivíduo, que possui uma deformidade, na sociedade, para que possa sentir-se aceito e igual. Parafraseando Barbosa Moreira, deve ser assegurado o direito de ser igual, quando a diferença acaba por inferiorizar o indivíduo.

 

Genival Veloso de França, faz apontamentos no tocante a importância desses tratamentos, mencionando especificamente a cirurgia plástica reparadora para a inclusão do indivíduo:

 

(…) a cirurgia plástica, em algumas vezes denominada reconstrutora, reparadora ou corretiva, é de indiscutível legitimidade e da mais insuspeita necessidade quando seu objetivo se destina a corrigir condições deformadoras congênitas ou adquiridas e mutilações resultantes de traumas.

 

Assim, uma cirurgia reparadora para corrigir um lábio leporino ou uma sequela de câncer de mama e as lesões oriundas de um trauma de face, na tentativa de restaurar o indivíduo à sua configuração habitual, reintegrando-o em suas possibilidades sociais, não há o que discutir: é ético, legal e necessário.[19]

Esse tratamento estético reparador busca eliminar ou diminuir determinada deformidade, o que, por si só, já traz impactos significativos para a vida do paciente. Nele, a responsabilidade é chamada de meio.

Nos tratamentos estéticos embelezadores, diferentemente do anterior, ele não busca uma ação corretiva, mas sim uma melhora na aparência. Neste caso, quando o paciente busca este tipo de intervenção, os motivos que o levam não são emergenciais, pois para a realização da mesma, deve estar bem de saúde.

Diferentemente do tratamento reparador, os motivos que levam à busca dos procedimentos embelezadores quase sempre, não é a inclusão, aceitação, mas sim a vaidade, a busca por um padrão de beleza imposto pela sociedade.

Há quem defenda que mesmo o tratamento estético embelezador seria inclusivo, tendo tanta importância para os indivíduos quanto o tratamento estético reparador, como é o caso de Gustavo Borges.[20]

Quando o cirurgião se dispõe a fazer um tratamento estético embelezador, a responsabilidade por ele assumida é diversa da que assume quando realiza um tratamento estético reparador. A responsabilidade não seria de meio, mas sim de resultado.

 

 

3.1 Erro médico em tratamento estético embelezador

O médico, assim como os outros profissionais são sujeitos a erro. O problema é que o médico, por lidar diretamente com a vida do paciente, acaba por assumir demasiada responsabilidade, e um erro no exercício da sua profissão, pode muitas vezes ser devastador.

Mesmo sendo passíveis de falhas, a relação médico-paciente ganha contornos mais drásticos trata-se de cirurgião plástico. Quando o paciente procura por este tipo de profissional, o nível de exigência é diferente. Tratando-se especificamente do erro em cirurgia plástica.

É imprescindível que seja verificado a obrigação assumida, neste caso, pelo cirurgião estético, se o mesmo assegurou que garantiria o resultado, ou apenas assumiu o compromisso de meio, usando as técnicas disponíveis para obter o melhor resultado possível. É a chamada responsabilidade de resultado e responsabilidade de meio.

Partindo dessa diferenciação, deve-se observar as consequências da culpa e erro profissional. Se o erro é inerente a qualquer atividade, é de suma importância que seja verificado se o erro cometido era de certa forma previsível, porque se não o fosse, estaríamos depositando no médico-cirurgião responsabilidade desumana. Faz-se uma divisão quanto ao tipo de erro, podendo ser escusável ou inescusável.

O erro escusável, chamado de erro profissional[21], seria o erro imprevisível. É originado por fatores que fugiam ao controle do médico quando da realização da cirurgia. Por outro lado, caracterizando a culpa, temos o erro chamado inescusável ou grosseiro. É no erro inescusável que é possível a verificação propriamente dita do erro médico, conforme aponta Gustavo Borges.[22]

Diante desta divisão, o erro médico só estaria caracterizado quando nos depararmos com o erro inescusável, podendo ser suscitado através de três possibilidades, a saber, a imprudência, negligência e imperícia. Apenas quando verificado que houve falta de conduta correta é que se vislumbra a chamada culpa médica, e somente neste caso é que o mesmo deverá responder.

 

 

4. Responsabilidade civil do médico no tratamento estético embelezador

 

A obrigação assumida pelo médico-cirurgião depende do tipo de tratamento realizado. A seguir temos os dois tipos de obrigação.

 

 

4.1 Obrigação de meio

Na obrigação de meio, o médico não tem como garantir o resultado satisfatório, apenas assume o compromisso de buscar uma melhoria significativa na correção da deformidade. Quanto a obrigação de meio, verifica-se que esta é a regra geral adotada no tocante a atividade do médico:

Os médicos, pelos serviços que prestam, desempenham uma obrigação de meio. Nessas obrigações, não se assume o dever de se chegar a determinado resultado (a cura, por exemplo), mas apenas o dever de se portar com diligência e atenção, à luz dos atuais de sua ciência, de cujo conteúdo se espera que tenha notícias atualizadas. A jurisprudência brasileira parece firme no sentido de considerar a obrigação do médico como obrigação de meio.[23]

É o que ocorre na cirurgia reparadora ou corretiva, o médico busca a melhoria na correção da deformidade, e não garante que esta atinja um patamar alto idealizado pelo paciente. Está incluído neste tipo de cirurgia todas as que buscam uma correção de deformidade ocasionada por acidente, doenças ou até mesmo defeitos genéticos.

 

 

4.2 Obrigação de resultado

Quando o médico assume a obrigação de resultado, ele responde se não atender ao fim acordado. Esta responsabilidade de resultado ou fim, é a assumida nos casos de cirurgia plástica estética, por exemplo. Para Sérgio Cavalieri Filho:

O mesmo já não ocorre com a cirurgia estética. O objetivo do paciente é melhorar a aparência, corrigir alguma imperfeição física – afinar o nariz, eliminar as rugas do rosto etc. Nesses casos, não há dúvida, o médico assume obrigação de resultado, pois se compromete a proporcionar ao paciente o resultado pretendido. Se esse resultado não é possível, deve desde logo alertá-lo e se negar a realizar a cirurgia.[24]

Logo, diferentemente do tratamento estético reparador, se no tratamento embelezador, o paciente não tem atendida as expectativas que foram almejadas, o médico deverá ser responsabilizado. Neste caso, mesmo que se trate de responsabilidade subjetiva, estaremos diante de culpa presumida.

É pacífico nos tribunais que, a obrigação assumida pelo médico nos casos de tratamento estético embelezador é uma obrigação de resultado. Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA COM PRESUNÇÃO DE CULPA. CAUSAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE. REEXAME. SÚMULA 7/STJ.

 

Em hipótese de procedimentos cirúrgicos para fins estéticos, a obrigação assumida pelo profissional médico é de resultado, caracterizando-se verdadeira responsabilidade civil com presunção de culpa, cabendo ao profissional elidi-la de modo a exonerar-se da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente.

 

2. Caso concreto em que a Corte de origem consignou que os recorrentes não lograram êxito em demonstrar a presença de causa excludente de responsabilidade. Rever tal entendimento demandaria revolvimento do arcabouço fático-probatório colacionado aos autos, o que é vedado pelo enunciado da Súmula 7 do STJ.

 

3. Recurso especial não provido. (Superior Tribunal de Justiça STJ – RECURSO ESPECIAL : REsp 1554749 DF 2015/0226921-8) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS – TRATAMENTO A LASER – QUEIMADURAS DE SEGUNDO E TERCEIRO GRAU – DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – DANOS MORAIS E ESTÉTICOS CONFIGURADOS – FIXAÇÃO – RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – Comprovada a culpa do profissional médico e presentes os requisitos do dano e do nexo de causalidade, resta configurado o dever de indenizar.

 

– As queimaduras de segundo e terceiro graus decorrentes de defeito na prestação do serviço acarretam constrangimentos e incômodos na vítima, gerando abalo psicológico e sofrimento, caracterizando-se, desse modo, o dano moral, passível de reparação financeira.

 

– A  fixação do valor  da indenização por danos morais pauta-se pela aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Sendo incontroverso o defeito na prestação do serviço contratado, o consumidor faz jus ao recebimento das quantias despendidas para resolução do problema. (TJ-MG / AC: 0163133-42.2015.8.13.0525. Relator(a): Des.(a) Rogério Medeiros. Data de Julgamento: 15/03/2018)

Vale destacar que o médico não pode invocar a sua discricionariedade na escolha das técnicas para se eximir do resultado diverso, pois uma vez que o paciente o procura e ele vende um resultado, esse deve ser atingido. Decisão nesse sentido (STJ – RECURSO ESPECIAL REsp 1395254 SC 2013/0132242-9)

 

 

Conclusão

A responsabilidade civil do médico sofreu grande modificação com o passar dos anos. Em razão do avanço tecnológico os tratamentos estéticos têm sido procurados como qualquer outro tratamento simples. No sistema atual, é pacífico o entendimento de que o médico cirurgião responde sim por danos causados aos pacientes. A variante neste caso é a responsabilidade assumida por ele.

Quando estamos diante de um tratamento reparador ou corretivo, a responsabilidade é de meio. O médico emprega as técnicas para o melhor resultado possível, não garantindo que a cirurgia atinja determinado patamar de beleza, apenas um melhoramento.

Diante do tratamento estético embelezador o cenário é totalmente diferente. O paciente neste caso quer um tratamento, via de regra, por vaidade. Ele quer atingir um patamar de embelezamento. Por sua vez o cirurgião se compromete a atingir este resultado. Logo, a responsabilidade civil do médico nesse caso é de fim, pois ele deve atingir o resultado esperado pelo paciente.

Por fim, conclui-se que, quando nos deparamos com um dano estético sofrido pelo paciente em um tratamento embelezador, a responsabilidade do médico-cirurgião, mesmo sendo de natureza contratual, ela será presumida, decorrente da responsabilidade de resultado assumida pelo cirurgião.

 

*Flávia Lucas Gomes é advogada, pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD) e pós-graduanda em Direito Tributário pela Rede de Ensino LFG.

 

*Cesar Peghini é doutor em Direito Civil pela PUC/SP com mestrado em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito (FADISP). Especialista em Direito do Consumidor na experiência do Tribunal de Justiça da União Europeia e na Jurisprudência Espanhola, pela Universidade de Castilla-La Mancha (Toledo/ES).

 

Também é especialista em Direito Civil pela Instituição Toledo de Ensino ITE; em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD) É graduado em Direito pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e professor da Rede LFG.

 

Bibliografia

ALVES, Rainer Grigolo de Oliveira; LOCH, Jussara de Azambuja. Responsabilidade Civil do cirurgião plástico em procedimentos estéticos: aspectos jurídicos e bioéticos.

 

Revista Bioética. 20 (3), 2012. Disponível em: http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/758 Acesso em: 28 ago. 2015.

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 4ª edição., São Paulo: Saraiva, 2015.

BORGES, Gustavo. Erro Médico nas Cirurgias Plásticas. – São Paulo: Atlas, 2014.

CROCE, Delton; CROCE JR., Delton. Erro Médico e o Direito., 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2002.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol 7, Responsabilidade Civil. 29ª Ed – São Paulo: Saraiva, 2015.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Novo Tratado de Responsabilidade Civil. – São Paulo: Atlas, 2015.
FILHO, Cavalieri Sergio. Programa de Responsabilidade Civil., 11ª edição. São Paulo: Atlas, 2014.

FRANÇA, Genival Veloso de. Comentários ao Código de Ética Médica, 6ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.

FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico, 12ª edição., Rio de Janeiro: Forense, 2014.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 15ª edição., São Paulo: Saraiva, 2014.

LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade Civil do Médico. 2ª ed. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzato, 2001.

MÉLEGA, José Marcos; VITERBO, Fausto; MENDES, Flávio Henrique. Cirurgia Plástica – Os Princípios e a Atualidade. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.

MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum., 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2011.

MELO, Nehemias domingos de. Responsabilidade Civil por Erro Médico: Doutrina e Jurisprudência, 3ª edição. São Paulo: Atlas, 2014.
MERGULHÃO, Maria Fernanda Dias. Indenização Integral na Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2014.

Revista Bioética: Responsabilidade Civil do cirurgião plástico em procedimentos estéticos. Disponível em: http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/758
RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil, 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance, 3ª edição. São Paulo: Atlas, 2012.

SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5ª edição., São Paulo: Atlas, 2013.

SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma análise do direito comparado e brasileiro. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2009.

SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Série GVLAW – Responsabilidade Civil e Sua Repercussão nos Tribunais – 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v.2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014.

TARTUCE, Flávio. Coleção Rubens Limongi – Responsabilidade Civil Objetiva e Risco – Vol. 10. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.
TOMASI. Carolina; MEDEIROS, João Bosco. Português jurídico. São Paulo: Atlas, 2010.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil, (V. 4), 15ª edição. São Paulo: Atlas, 2015.

________________________________________

 

[1] FILHO, Cavalieri Sergio. Programa de Responsabilidade Civil., 11ª edição. São Paulo: Atlas, 2014. p. 14.

 

[2] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v.2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014. p. 306.

 

[3] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol 7, Responsabilidade Civil. 29ª Ed – São Paulo: Saraiva, 2015. p. 56.

 

[4] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 15ª edição., São Paulo: Saraiva, 2014. p 71.

 

[5] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v.2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014. p. 362.

 

[6] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: Responsabilidade civil, (V. 4), 14ª edição. São Paulo: Atlas, 2014. p 29.

 

[7] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v.2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014. p.362.

 

[8] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: Responsabilidade civil, (V. 4), 14ª edição. São Paulo: Atlas, 2014. p. 41.

 

[9] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol 7, Responsabilidade Civil. 29ª Ed – São Paulo: Saraiva, 2015. p. 84.

 

[10] MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum., 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2011. p.58.

 

[11] FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal, 10ª edição., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.

 

[12] LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 37

 

[13] LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 39

 

[14] LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 40.

 

[15] LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 41.

 

[16] LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil – 2. Ed. Ver. Atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 43

 

[17] FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal, 10ª edição., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.

 

[18] RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil, 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 335.

 

[19] FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico, 12ª edição., Rio de Janeiro: Forense, 2014.

 

[20] BORGES, Gustavo. Erro Médico nas Cirurgias Plásticas. – São Paulo: Atlas, 2014. p. 49.

 

[21] BORGES, Gustavo. Erro Médico nas Cirurgias Plásticas. – São Paulo: Atlas, 2014. p. 276.

 

[22] BORGES, Gustavo. Erro Médico nas Cirurgias Plásticas. – São Paulo: Atlas, 2014. p. 275.

 

[23] FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Novo Tratado de Responsabilidade Civil. – São Paulo: Atlas, 2015. p. 1153.

 

[24] FILHO, Cavalieri Sergio. Programa de Responsabilidade Civil., 11ª edição. São Paulo: Atlas, 2014. p. 445.

 

 

 

Conteúdo editado pela LFG, referência nacional em cursos preparatórios para concursos públicos e Exames da OAB, além de oferecer cursos de pós-graduação jurídica e MBA.

Artigos Relacionados

Navegue por categoria