Guia Completo para o Código de Defesa do Consumidor!

Código de Defesa do Consumidor: Homem analisa nota fiscal

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) foi instituído pela Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 e é um importantíssimo instrumento que regulamenta as relações de consumo, já que são direitos e deveres que expressam os Direitos Humanos, previstos na Constituição Federal de 1988.

É ainda um forte instrumento para que os cidadãos possam se responsabilizar pelos seus atos de forma consciente e os prestadores e fornecedores de serviços melhorem a prestação cada vez mais, mediante fiscalização.

Com o instrumento legal, as relações de consumo passaram a se dar de forma mais transparente e equilibrada ao passo que prevê direitos e deveres para ambas as partes.

Se você deseja ficar por dentro do assunto, confira este artigo com os principais aspectos da lei, princípios, jurisprudência aplicada, e muito mais!

Tenha uma ótima leitura!

Código de Defesa do Consumidor: Reta Final INSS

O que é a relação jurídica de consumo?

A relação jurídica de consumo é aquela estabelecida entre consumidor e fornecedor, que tem por objetivo a aquisição de um produto ou a contratação de um serviço.

Mas afinal, quem é considerado consumidor?

O consumidor é a pessoa física ou jurídica que utiliza ou obtém para si um produto ou um serviço na posição de destinatário final. Em linhas gerais, é a pessoa que compra uma mercadoria, serviço ou recurso para uso próprio, na última etapa da circulação do bem ou produto.

É o que dispõe o artigo 2º do CDC: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Qual é a diferença entre cliente e consumidor?

O cliente é a pessoa que adquire um determinado produto, mas que não precisa necessariamente usá-lo. É o típico caso de revendedores ou até mesmo de donos de supermercados — eles são clientes de uma empresa que os fornece produtos para revenda.

Por outro lado, o consumidor é a pessoa que compra ou adquire aquele produto, em sua última etapa de circulação no mercado, para consumo próprio. Aqui vale uma ressalva: o consumidor final não precisa necessariamente pagar pelo serviço adquirido. É o caso de um aluno de faculdade (consumidor final), cuja mensalidade é paga pelos pais.

Quais são os princípios do CDC?

Muitas pessoas podem não ter conhecimento, mas ter suas relações de consumo resguardadas é direito constitucional previsto no artigo 170 da CF/88, como um princípio da ordem econômica.

Nesse sentido, a legislação e a doutrina majoritária preveem como princípios do CDC os seguintes descritos abaixo, num rol meramente exemplificativo:

  1. Princípio da proteção do consumidor pelo estado;
  2. Princípio da vulnerabilidade do consumidor;
  3. Princípio da responsabilidade solidária;
  4. Princípio da educação;
  5. Princípio da transparência;
  6. Princípio da qualidade e segurança;
  7. Princípio da igualdade e;
  8. Princípio da informação.

 Agora, vamos comentar em mais detalhes sobre cada um! 

1. Princípio da Proteção do Consumidor pelo Estado

Previsto no artigo 5 º, XXXII, da Carta Magna, este princípio prevê que é dever do Estado promover a defesa do consumidor, principalmente por ser este a parte hipossuficiente da relação de consumo.

Vale a pena conferir também o artigo 4º, II, do CDC, que verda sobre a intervenção direta do Estado nas relações consumeristas.

2. Princípio da vulnerabilidade do consumidor

O consumidor é considerado a parte mais frágil da relação consumerista, que pode ser fruto da falta de conhecimento do cidadão acerca de seus direitos, ausência de conhecimento técnico e condições socioeconômicas e outros.

Esse princípio está previsto no artigo 4º, I, do CDC e tem o objetivo de promover o equilíbrio contratual ao proteger a parte mais vulnerável — o consumidor. 

3. Princípio da Responsabilidade solidária 

O princípio tem como objetivo efetivar a proteção, de forma mais assertiva ao cidadão consumidor em caso de alguma possível lesão ao seu direito, garantindo que todos os fornecedores respondem de forma solidária em caso de danos (independe de culpa — responsabilidade objetiva).

A previsão está nos artigos 7, parágrafo único; 25, §1º e artigo 18, todos do CDC. 

4. Princípio da educação

Garante que o Estado e seus municípios promovam ações políticas e educativas que visem dar conhecimento aos cidadãos de seus direitos. 

Exemplo: Obrigatoriedade de que todos os estabelecimentos possuam um Código de Defesa do Consumidor.

5. Princípio da transparência

O objetivo e os pilares são pautados na boa-fé, onde consumidores, fornecedores e prestadores de serviço sejam transparentes e leais entre si.

6. Princípio da Qualidade e segurança

Este princípio está disposto no artigo 4, II, “d” do CDC e garante que todos os produtos e serviços devem ter “padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho”. 

Em outras palavras, os produtos e serviços não devem oferecer risco ou danos à saúde dos cidadãos consumidores e, caso ofereçam, que isso seja explícito para os devidos cuidados. 

Exemplos: Produtos químicos e inflamáveis.

7. Princípio da igualdade 

Decorre diretamente da ideia de que todo consumidor é a parte hipossuficiente da relação consumerista, portanto, ambas as partes — em especial o fornecedor ou prestador do serviço — devem agir de forma clara e dotados de boa-fé.

8. Princípio da informação

Disposto no artigo 4º, IV do CDC, o princípio prevê que é direito de todos os consumidores e também fornecedores e prestadores de serviço o acesso à informações quanto aos seus direitos e deveres, de modo o melhorar as relações consumeristas.

Assim, para que se estabeleça o equilíbrio nas relações de consumo é necessária uma relação especial, sendo essa disposta e prevista na Constituição Federal e no Código de Defesa do consumidor, regras que devem ser respeitadas e cumpridas independente da origem socioeconômica ou grau de vulnerabilidade do consumidor.

Código de Defesa do Consumidor

Quais são os direitos do Consumidor?

Listamos abaixo, em um rol exemplificativo, alguns direitos dos consumidores, tanto nos serviços prestados pelo Poder Público quanto no âmbito privado. São eles:

  1. Obter serviços e produtos adequados e com qualidade;
  2. Direito à informação;
  3. Direito à reivindicação;
  4. Proteção na assinatura de contratos;
  5. Direito à participação;
  6. Direito à educação;
  7. Direito de escolha;
  8. Direito de troca.

Conheça-os:

1. Obter serviços e produtos adequados e com qualidade

Entendidos assim como aqueles que garantem os requisitos mínimos para suprir suas necessidades.

2. Direito à informação

Obtendo sempre dados precisos e claros, suficientes, apropriados e verdadeiros sobre aquilo que se adquiriu ou sobre a oferta do produto ou serviço, além dos riscos aos quais poderão surgir a partir do seu uso ou consumo.

3. Direito à reivindicação

Representado no direito de ação do consumidor em ir direto ao prestador para reivindicar a reparação integral caso haja dano — dentro dos limites permitidos e previstos, tanto na esfera administrativa quanto na judicial.

4. Proteção na assinatura de contratos

Estando resguardados quanto à contratos abusivos, com cláusulas leoninas em instrumentos de adesão, por exemplo.

5. Direito à participação

Que se resume no direito de ser representado por autoridades que desempenham funções públicas, de modo a resguardar a representatividade e serem ouvidos em suas demandas e anseios.

6. Direito à educação

De modo que esses cidadãos possam ser instruídos, treinados sobre consumo e ter informações repassadas, de tal forma que estes possam tornar o direito já previsto em direitos realmente efetivos.

7. Direito de escolha

Talvez um dos mais importantes e conhecidos, que é o direito de escolher e decidir, de forma livre, os bens e serviços dos quais necessita.

8. Direito de troca

Previsto no art. 26 do CDC, onde o consumidor tem direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação nos prazos de 30 ou 90 dias, a depender de cada situação — tema que será abordado nos próximos tópicos.

Leia também: Direitos do consumidor: entenda como funciona a troca de produtos

Quais são os deveres dos consumidores?

Como já sabemos, no ordenamento jurídico, toda e qualquer relação é pautada numa via de mão dupla: direitos x deveres.

Nas relações consumeristas não é diferente: para que suas reclamações ou reivindicações, caso existam um dia, possam prosperar, é necessário que o consumidor assuma alguns deveres. São eles:

  • Ler atentamente documentos e contratos antes de assiná-los, para que não seja surpreendido no futuro com cláusulas desconhecidas;
  • Dever de agir quando, em alguma hipótese se sentir lesado ou enganado e, assim garantir que outros consumidores também não passem pela mesma situação;
  • Dever da consciência crítica, que resume-se à necessidade de vigilância aos preços e à qualidade dos produtos e serviços ofertados, para que não haja prática abusiva;
  • Agir de boa-fé perante àqueles que ofertam produtos e serviços, tais como os fornecedores, produtores e autoridades públicas, não oferecendo denúncias e reclamações falsas ou com intenção de tirar proveito próprio;
  • Realizar os pactos e acordos de bens e serviços dentro do que a lei prevê como legalmente estabelecido;
  • Não realizar denúncias imprudentes contra prestadores e fornecedores de serviço, com alegações infundadas.

O que são práticas abusivas?

O CDC prevê em seu artigo 39 e incisos a proibição de práticas abusivas dos fornecedores e prestadores de serviços face aos consumidores.

A ideia de prática abusiva está diretamente relacionada ao abuso de poder, o que obrigou o legislador a coibir tais ações e dar equilíbrio à relação consumerista. 

Assim, pelo fato de tais práticas existirem com maior habitualidade do que o esperado, o CDC elencou, num rol não taxativo, algumas hipóteses onde essas práticas são veemente proibidas. São elas:

  1. Condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, ou impor a limites quantitativos. 

É o típico caso da venda casada, veemente proibida por lei. Outro exemplo muito comum é quando um cinema exige que os telespectadores só comprem alimentos de seu estabelecimento próprio;

  1. Recusar atendimento às demandas dos consumidores, sem justo motivo;
  2. Enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço. 

Um exemplo comum é quando instituições bancárias enviam cartões aos correntistas, sem solicitação prévia. As amostras grátis também entram aqui, não havendo, portanto, obrigação de pagamento em nenhum dos casos;

  1. Aproveitar da fraqueza ou ignorância do consumidor, por questões de idade, saúde e outros, para forçar a compra de seus produtos ou serviços. 

Exemplo: venda de produtos e serviços a crianças e idosos vulneráveis;

  1. Exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
  2. Executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor;
  3. Repassar informação depreciativa, de ato praticado pelo consumidor. O artigo 42, o CDC dá um exemplo claro da vedação de tal prática, ao dispor que “na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça”. Leia também: artigo 71 do CDC;
  4. Colocar no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes;
  5. Recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento;
  6. Elevar o preço dos produtos ou serviço, sem justa causa;
  7. Deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação;
  8. Aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido;
  9. Permitir o ingresso em estabelecimentos comerciais ou de serviços de um número maior de consumidores que o fixado pela autoridade administrativa como máximo.

Prática abusiva x prática comercial: entenda a diferença

Fato é que, não se pode confundir práticas abusivas com práticas comerciais.

A prática comercial é tudo aquilo compreendido no Capítulo V, do Código de Defesa do Consumidor e seguintes.

Já as práticas abusivas podem ser denominadas como aquelas que vão totalmente de encontro ao CDC e as normas previstas em defesa do consumidor. Ou seja, quando são praticados atos contrários às normas e passíveis de punição.

Como visto, as referidas condutas são as denominadas violações de direito onde o fornecedor ou prestador de serviço coloca a relação consumerista em desequilíbrio ao induzir, por exemplo, o consumidor a erro, por ocultar alguma informação relevante, fazer uma propaganda enganosa ou pressioná-los a adquirir um produto ou serviço.

Jurisprudência sobre prática abusiva

A jurisprudência já firmou inclusive, entendimento de que, a propaganda enganosa, a depender do caso de sua gravidade, pode ser configurado crime de estelionato. Observe:

“Tribunal de Alçada Criminal. Décima Quinta Câmara. Apelação Criminal nº 1.206.637/1. Comarca: Guarujá. Apelante: KCO. Apelado: Ministério Público. Voto nº 2291. Relator – Prática estelionato (art. 171, “caput”, do Cód. Penal) o sujeito que vende linhas telefônicas e recebe do comprador de boa-fé o preço total da transação, mas não lhes transfere sob o argumento de não as haver disponíveis. (…)

É manifesto o dolo (“animus laedendi”) de quem assim procede, pois dá à venda o que não tem. Incorre nas penas do art. 67 da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), por delito de propaganda enganosa, aquele que, no intento de vender produtos e prestar serviços, apregoa-lhes, para conciliar clientela, atributos que não possuem ou não respondem à verdade”. (destaques nossos)

No caso acima narrado, o Tribunal decidiu pela pena de reclusão de 2 anos, no regime aberto, além de 25 dias-multa, pela infração do art. 171, “caput”, combinado com o art. 29, do Código Penal, e 2 anos de detenção, no regime aberto, pelas infrações dos arts. 67 e 69, do CDC.

O Tribunal de Justiça do Amapá também já firmou entendimento de que: 

“para configuração do delito de propaganda enganosa, previsto no artigo 67, do Código de Defesa do Consumidor, não se mostra necessário o resultado lesivo, bastando a veiculação da publicidade ou oferta enganosa. (…) são elementos idôneos a dar lastro à sentença condenatória pela prática de delito de estelionato, na medida em que demonstram que o agente, mediante ardil, induziu a primeira a erro, causando-lhe prejuízo e obtendo vantagem indevida com a sua conduta” – Tribunal de Justiça do Amapá, Apelação 49.2012.8.03.0001 AP.

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Qual a diferença entre vício e defeito para o CDC?

O professor da LFG e doutor em Direito Civil, João Aguirre ressalta que o sistema de proteção ao consumidor prevê regras que fazem a distinção de vício e defeito.

Assim, vício se configura como um problema relacionado à qualidade ou à quantidade do produto ou do serviço.

defeito é decorrente de um produto ou serviço que não oferece a segurança que dele legitimamente se espera.

“Assim, como exemplo de vício pode-se citar um produto que não funciona, como um telefone que não recebe ligações. Já como exemplo de um produto defeituoso podemos pensar em um telefone cuja bateria superaquece e vem a explodir, causando danos físicos aos consumidores. No caso de produtos ou serviços que contenham vícios, é muito importante que o consumidor tenha conhecimento dos prazos para efetuar a sua reclamação”, esclarece Aguirre.

Quando o consumidor tem direito a devolução do dinheiro?

O Código de Defesa do Consumidor estabelece, basicamente, três hipóteses em que o consumidor final pode ter seu dinheiro de volta (art. 49, CDC). São elas:

  1. Arrependimento da compra;
  2. Descumprimento da oferta;
  3. Produto defeituoso. 

Contudo, existem regras específicas para cada uma dessas situações para que a devolução possa efetivamente se concretizar, a saber:

1. Arrependimento da compra

  1. a) Compra realizada pela internet ou por telefone

Nessa modalidade, o consumidor poderá se arrepender da compra e ter seu dinheiro de volta.  Contudo, alguns requisitos devem ser observados — dispostos no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõe:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Nessa modalidade o CDC prevê que, caso o consumidor se arrependa de uma compra feita fora do estabelecimento comercial físico — na internet ou por telefone — ele terá o direito de se arrepender e ter a contratação daquele serviço ou compra de produto cancelada.

Esse prazo será de sete dias e começará a contar do momento da contratação do serviço ou assinatura do contrato ou do recebimento do serviço ou produto, a depender do caso.

Após o encerramento desse vínculo firmado anteriormente por meio de contrato, duas coisas deverão acontecer conjuntamente e de forma imediata:

  • O produto deverá ser devolvido ao fornecedor;
  • Os valores pagos pelo consumidor, deverão ser restituídos a ele, com as devidas atualizações. 

Aguirre reforça que o consumidor deve sempre questionar ao comerciante sobre a possibilidade de trocar o produto.

“As empresas só são obrigadas a efetuar a ação em caso de produtos com vício. Porém, se no ato da compra o comerciante confirmar que realiza a troca, ele deverá cumprir com a obrigação assumida, conforme estabelece o Código de Defesa do Consumidor (CDC) em seu artigo 30”, explica o professor.

  1. b) Compra realizada na loja física

Quando o consumidor realiza a compra diretamente na loja física, o direito de arrependimento, por si só, não se aplica, com exceção de defeitos ou danos nos produtos e bens adquiridos, dos quais não há possibilidade de reparo.

Segundo o art. 12, § 1° do CDC “O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes”.

Nessa hipótese, o estabelecimento comercial tem até 30 dias para resolver o problema, sendo que será averiguado e testado para saber se de fato há defeito ou não.

Sendo constatado o defeito – sem possibilidade de reparo, o consumidor tem três opções, a saber:

  1. Substituir a mercadoria com avaria por outro produto que esteja em perfeitas condições de uso, conquanto que seja da mesma espécie;
  2. Receber a restituição imediata do valor que foi pago pela mercadoria avariada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos, quando for o caso;
  3. Abatimento proporcional do preço pago pela mercadoria.

2. Descumprimento da oferta

Hoje em dia é comum ver propagandas com falsas promessas de produtos incríveis e perfeitos, de forma a atrair novos consumidores e seu desejo de aquisição, com propagandas totalmente enganosas.

Não é incomum que, ao receber o produto em casa, o consumidor se depare com mercadorias completamente diferentes daquelas oferecidas nas propagandas, com qualidade muito inferior e características diferentes daquelas anunciadas.

Nesses casos, o CDC atua diretamente, de modo a proteger esses consumidores, proporcionando três maneiras de ver esse imbróglio solucionado.

É o que prevê o artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 35: Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;

II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

Independente da opção escolhida pelo consumidor, é aconselhável enviar uma solicitação por escrito à empresa que vendeu a mercadoria, tais como carta com AR ou e-mail, relatando o ocorrido, juntamente com a nota fiscal.

Caso a solicitação do consumidor não seja atendida, é possível que este ingresse com uma ação judicial.

3. Em casos de produtos defeituosos

Em várias situações, o produto adquirido já chega ao seu destino final com algum defeito, seja ele aparente ou não. Nesses casos, também é possível solicitar o reembolso do valor anteriormente pago, mas é necessário ficar atento aos prazos previstos na legislação.

Esse assunto é tratado no Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 18, que assim dispõe:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Assim, após identificar as possíveis avarias nos produtos, bens ou serviços adquiridos e, não tendo sua solicitação atendida no prazo máximo de 30 dias (§ 1°), o consumidor pode se valer de três opções, alternativamente, a saber:

  1. Substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
  2. A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
  3. Abatimento proporcional do preço.

Mas atenção! Para que o consumidor possa fazer sua reclamação e ver seu direito atendido em uma das opções acima, os produtos devem ser considerados perecíveis ou não duráveis, conforme a letra da lei, ou seja, aqueles que estão sujeitos a deteriorar-se, a extinguir-se.

Contudo, se o produto for considerado durável esse prazo se estende para 90 dias.

“O consumidor deve ficar, portanto, bastante atento aos obstáculos criados pelo fornecedor para o exercício de seu direito, tais como a informação de um prazo menor do que o previsto em lei. 

É muito comum que seja informado que o prazo para a troca de um produto que contenha vício é de 24 horas ou de 48 horas, quando na verdade a lei estabelece um prazo bem mais dilatado”, destaca Aguirre

Mas sabemos que nem sempre a realidade é essa e em muitos casos, o consumidor fica sem nenhuma resposta do fornecedor ante sua reclamação.

Quando a reclamação do consumidor não é atendida, o que pode ser feito?

Infelizmente, sabemos que muitos fornecedores não dão a atenção esperada e não cumprem o que a lei determina em casos como os descritos acima, e deixam os consumidores sem nenhuma resposta e resolução do problema.

Quando isso acontece, é necessário que estes tomem medidas mais firmes, tais como:

  • Acionar o Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON);
  • Ingressar com uma ação judicial no Juizado Especial;
  • Registrar uma reclamação no Portal gov.br ou nos sites Reclame Aqui.

Quando o consumidor tomar uma dessas medidas, o fornecedor ou a empresa será notificada pelos órgãos competentes e terá um prazo (normalmente menor que 30 dias), para apresentar uma resposta e/ou solução.

O que é o Procon?

Segundo o Portal gov.br, o Procon é “um serviço público que permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução de conflitos de consumo”.

O Programa é um serviço do poder executivo e atende demandas no âmbito municipal e estadual — assunto disciplinado no capítulo V do Código de Defesa do Consumidor.

Portanto, a função do Procon é a mediação direta entre as partes envolvidas sempre no sentido de conduzi-las a um acordo. Mas isso nem sempre é possível. Quando isso acontece, o consumidor deverá agir da seguinte forma:

  1. O consumidor registra a reclamação;
  2. Será lavrado auto de infração e instaurado o processo administrativo;
  3. O fornecedor/empresa responde a demanda ou já propõe acordo;
  4. O Procon monitora o prazo para cumprimento.

Antes do julgamento do processo administrativo, poderá ser designada uma audiência para tentativa de conciliação, uma vez que, muito embora constitua um órgão do executivo, este funciona como instância de instrução e julgamento de poderes.

Assim, caso a empresa não apresente, de antemão, uma proposta de acordo, a audiência poderá se realizar para mais uma tentativa de acordo. 

Caso as partes se ajustem e firmem um acordo, o processo administrativo será arquivado. Do contrário, as próximas etapas serão:

  1. Julgamento do processo administrativo e, tendo o consumidor razão, será fixada multa à empresa e prazo para cumprimento da obrigação;
  2. Caso a multa não seja paga e o valor devolvido, o débito será inscrito na dívida ativa do estado ou município, a depender do caso;
  3. Caberá execução da dívida.

Quem pode utilizar o serviço do Procon?

Como já dito anteriormente, os Procons atendem demandas de âmbito estadual e municipal e funcionam com o acolhimento direto de demandas dos cidadãos consumidores e suas reclamações frente às empresas e fornecedores para que essas possam reparar possíveis danos causados.

Para registrar uma reclamação junto ao Programa de Proteção e Defesa do Consumidor, é necessário que o “autor” dessa demanda seja:

  • Cidadão ou sua Família;
  • Empresas privadas;
  • Órgãos e entidades do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. 

Os PROCONS oferecem esse serviço de atendimentos em vários formatos, a depender de cada município, podendo ser:

  • De forma presencial;
  • Por telefone ou fax;
  • No portal gov.br ou e-mail;
  • Pela ouvidoria dos municípios;
  • Por correio. 

Atuando dessa maneira, o Programa de Proteção e Defesa do Consumidor tem como objetivo e missão fazer com que os direitos previstos no CDC possam ser de fato efetivados, proibindo e coibindo práticas abusivas, desleais e fraudulentas, de modo a garantir um mercado consumerista justo para todas as partes.

O CDC aplicável aos Serviços Públicos

O acesso a serviços públicos eficazes e adequados, como luz, telefone e água são direitos básicos protegidos pelo CDC.

Em um país em que se fala tanto em corrupção, suspeita de improbidade administrativa e onde o poder público está sempre em evidência na imprensa por ser réu em ações judiciais, o professor Fabrício Bolzan explica que um dos grandes desafios do direito brasileiro no mundo contemporâneo é trazer a incidência do Código de Defesa do Consumidor ao serviço público.

Existem três conceitos básicos presentes no Código de Defesa do Consumidor que precisamos avaliar para saber se é possível aplicá-los aos serviços públicos:

  1. Verificar se é possível enquadrar o usuário no conceito de consumidor;
  2. Avaliar se a administração pública ou suas concessionárias e permissionárias se enquadram no conceito de fornecedor;
  3. Garantir que o serviço público se enquadre no conceito de serviço.

Em última análise, é importante saber se é possível enquadrar esses elementos — usuário de serviço público, o poder público e o serviço público — na relação jurídica de consumo.

Quem são as vítimas de evento danoso? 

O artigo 17 do CDC fala sobre o consumidor como vítima de um evento danoso:

Art. 17: Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

“Basta pensarmos em uma vítima de acidente envolvendo transporte coletivo para trazer a figura do usuário do serviço público como consumidor por equiparação”, explica Bolzan.

Usuário do serviço público é consumidor?

Sim. O professor Fabrício Bolzan recorre ao Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078 de 11 de setembro de 1990, para enquadrar o usuário de serviço público no conceito de consumidor em sentido estrito: Art. 2°: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

“Nesse sentido, sem dúvidas o usuário do serviço público se enquadra no conceito de consumidor em sentido estrito. Como exemplo, basta pensar no serviço de energia elétrica, ao qual somos destinatário final”, explica Bolzan.

Fabrício lembra que, além do sentido estrito, o CDC traz três conceitos de consumidor por equiparação, um deles no Art. 2º, Parágrafo único: Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Com base no artigo citado, Fabrício enquadra o usuário de serviço público no contexto de consumidor coletivo e explica que uma coletividade de usuários pode entrar com uma ação coletiva na busca da melhoria de um determinado serviço.

Terceiro não usuário e a responsabilidade objetiva

Em 2005, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o terceiro não usuário não poderia invocar a responsabilidade objetiva, mas em 2008 mudou sua posição e consolidou, pelo regime de repercussão geral, que tanto o usuário do serviço público como o terceiro não usuário do serviço público podem invocar a responsabilidade objetiva.

“Na nossa visão, e defendemos isso desde 2005, o não usuário do serviço público também pode se enquadrar na vítima do evento danoso. E nós sabemos que o Código de Defesa do Consumidor traz como regra a responsabilidade objetiva do fornecedor”, conta o professor.

Por fim, um último conceito de consumidor por equiparação está no artigo 29 do CDC, que fala sob um aspecto coletivo envolvendo as pessoas expostas às práticas comerciais e contratuais abusivas: Art. 29: Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

Em resumo, caso haja uma prática comercial ou contratual abusiva envolvendo o serviço público, o professor encontra nesse artigo a figura do usuário enquadrado como consumidor.

O serviço público como fornecedor de serviço

Com base no artigo terceiro do Código de Defesa do Consumidor, o professor Fabrício Bolzan enquadra a figura dos concessionários ou permissionários de serviços públicos no conceito de fornecedor.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Ainda com base no artigo terceiro, inciso segundo do CDC, é possível enquadrar o serviço público no conceito de serviço:

Art. 3º § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Basicamente, exige ser um serviço remunerado, tal como é o serviço público.

Partindo do artigo quarto do Código de Defesa do Consumidor, temos menções expressas da incidência do CDC aos serviços públicos: 

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo […]

Já o artigo sexto fala sobre os direitos básicos do consumidor:

Art. 6º: São direitos básicos do consumidor:

I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Interação entre o Código de Defesa do Consumidor e a Lei 8.987/95

A Lei nº 8.987 de 13 de fevereiro de 1995 dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 175: Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. 

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

II – os direitos dos usuários;

III – política tarifária;

IV – a obrigação de manter serviço adequado.

Ou seja, esse fornecimento é incumbência do Estado, conforme previsão constitucional, sendo sempre de sua titularidade (União, Estados, Municípios e Distrito Federal).

Essa prestação de serviço poderá se dar de forma direta (serviços públicos privativos) ou delegando-os a terceiros (serviços públicos não privativos) mediante:

  • Autorização;
  • Permissão;
  • Concessão.

Em paralelo a isso, o artigo 22 do CDC prevê a impossibilidade de interrupção desses serviços públicos essenciais, veja:

Art. 22: Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Assim, por força deste artigo, Fabrício Bolzan explica que, doutrinadores consumeristas renomados entendem que o serviço essencial não pode ser interrompido

Porém, há um conflito quando comparamos o artigo 22 do CDC e a Lei 8.987/95 sobre a prestação de serviços públicos. Seu artigo sexto contradiz o artigo 22 do CDC e admite a interrupção do serviço público em alguns casos, por exemplo:

Art. 6º, § 3º: Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

I – motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações;

II – por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Posicionamento do STJ

Bolzan diz que é muito comum, no nosso país, que os prestadores de serviço ignorem o artigo sexto no que diz respeito à descontinuidade do serviço sem aviso prévio.

“O STJ, apesar de admitir a interrupção por força do inadimplemento, não admite em alguns casos, como por exemplo se afetar a dignidade da pessoa humana ou unidades públicas essenciais, como hospitais ou escolas”, explica.

O STJ também não admite a interrupção de serviços se essa afetar direitos inadiáveis da coletividade, como a segurança pública. Sobre o assunto, ressalta: 

“Há casos em que municípios não pagam a conta de energia e a operadora suspende a iluminação em determinado bairro, o que não é permitido pois afeta um direito inadiável da coletividade, como é o caso da segurança pública” 

Nesse sentido, o professor Fabrício Bolzan defende uma posição intermediária em seus livros Direito do Consumidor Esquematizado e Direito Administrativo para Concurso:

“Apesar de já ter defendido que, por ser essencial o serviço público não poderia ser interrompido, passamos a analisar e perceber que nenhuma empresa se habilitaria a um procedimento licitatório para participar de uma concessão de serviço público se não tivesse esse poder de barganha, ou seja, poder interromper o serviço público como forma de forçar o pagamento daquela conta.

O meio termo que nós defendemos é que o concessionário do serviço público não pode interromper o serviço até demonstrar que o número de inadimplentes foi tamanho que afetou o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ou seja, quando a Lei 8.987/95 diz que é possível interromper o serviço por inadimplemento do usuário, ela fundamenta a interrupção considerado o interesse da coletividade.

Então, na nossa visão, a partir do momento em que a empresa concessionária comprova que o número de inadimplentes foi tamanho a ponto de comprometer a boa prestação de serviço público para essa coletividade, aí sim é permitido interromper esse serviço do consumidor inadimplente. Antes disso, na nossa visão, não há fundamentação para interromper” conta Fabrício.

De fato, ainda assim é necessário que a legislação se atualize sempre para acompanhar o desenvolvimento da sociedade e das relações existentes, aqui, especialmente a de consumo. 

Ainda, vale ressaltar que o STJ desempenha um papel interessante e de equilíbrio na aplicação da interação entre Direito Público e Direito do Consumidor.

Essa posição intermediária do STJ, se aplica o CDC ao serviço público desde que ut-singuli — serviços de fruição individual e divisíveis, dos quais é facilmente possível a identificação do consumidor final. Exemplo: serviço de transporte público e remunerado por tarifa, sendo um bom exemplo para um tribunal que tem que se deparar com matéria de ordem pública e de direito privado.

Muitas vezes, é necessário equacionar o meio-termo fazendo o diálogo entre as fontes e tentando buscar a melhor aplicação possível ao caso concreto.

“Como especialista e admirador do Direito Público e Direito do Consumidor, sigo a linha do STJ tentando sempre encontrar um meio termo”, finaliza Fabrício Bolzan.

Fabrício Bolzan é advogado, parecerista nas disciplinas de Direito Público e Direito do Consumidor e ex-Procurador efetivo do município de Mauá-SP. Mestre em Direito Constitucional na PUC-SP, doutorando em Direito Constitucional pela PUC – SP e palestrante exclusivo da LFG.

Esperamos que tenha gostado do conteúdo sobre o Código de Defesa do Consumidor! Aproveite para conferir também o nosso artigo Entenda o Princípio da Instrumentalidade das formas!

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