Confira o que diz o art. 109 CF e entenda a competência da Justiça Federal

Art. 109 CF: mãos sobre mesa com livros abertos
Entenda mais sobre a competência da Justiça Federal que está prevista no art. 108 e no art. 109 CF/88. Continue a leitura!

A competência da Justiça Federal está prevista no art. 108 e no art. 109 CF/88 e, sua competência originária, em matéria processual penal, é julgar os crimes em que estejam envolvidos bens ou interesses da União.

Estão excluídas desta categoria as contravenções, em razão da previsão legal específica contida no art. 109, IV do CPP e da Súmula n. 38 do STJ, cabendo, portanto, as contravenções, à competência da Justiça Estadual Comum.

Expressamente contemplado na Constituição Federal, portanto, o art. 108 cuida da competência dos Tribunais Regionais Federais – TRFs, enquanto o art. 109 trata da competência dos juízes federais.

Qual a importância da competência da Justiça Federal?

Diante do direito constitucional brasileiro, “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (art. 5.º, LIII, da CF), não havendo lugar para instalação de “juízo ou tribunal de exceção” (art. 5.º, XXXVII, da CF). (destaques nossos)

Isso significa que um dos direitos fundamentais mais caros à Carta Constitucional é o reconhecimento da competência do juiz enquanto parte integrante e indissociável do direito fundamental a um processo justo.  

O motivo disso é que a competência integra o princípio do juiz natural, basilar para a noção de processo num contexto de Estado Democrático de Direito.  Nas palavras do professor Ingo Sarlet:

“Juiz natural é juiz imparcial, competente e aleatório. É o juiz a que é constitucionalmente atribuído o dever de prestar tutela jurisdicional e conduzir o processo de forma justa.” (SARLET, 2022, p.2213)

Juiz natural é o juiz competente. Isto significa que a competência para prestação da tutela jurisdicional tem de estar estabelecida constitucionalmente antes da propositura da ação

Portanto, o estabelecimento da divisão de competência estadual e federal é base fundante para a viabilização de um processo justo no contexto de ordenamento constitucionalmente alinhado. 

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Como é a estrutura da Justiça Federal?

A Justiça Federal é o órgão do Poder Judiciário que tem como missão a pacificação dos conflitos que envolvem os cidadãos e a Administração Pública Federal, em diversas áreas. 

A Justiça Federal Brasileira está dividida da seguinte forma:

  • ​​​​​​​​27 Seções Judiciárias, uma para cada estado brasileiro e o Distrito Federal (primeiro grau de jurisdição);
  • 6 Tribunais Regionais Federais, denominados TRFs (segundo grau de jurisdição), distribuídos em 6 regiões.​

As Seções Judiciárias são agrupamentos de subseções. Essas subseções são compostas pelas varas, distribuídas entre a capital do estado e as cidades de seu interior. Cada estado possui sua própria Seção Judiciária, com um número variável de subseções abarcadas.

A primeira instância da Justiça Federal são os juízes federais e os juízes federais substitutos, que são distribuídos entre as varas federais, localizadas nas capitais e no interior dos Estados. Cada vara federal deve contar com dois juízes e com um corpo de servidores e estagiários, para atender aos processos que lhe são destinados.

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Estas Varas podem ser especializadas por matéria, ou não, a depender da quantidade de juízes e amplitude de demandas daquela subseção.

As seções judiciárias (que correspondem aos estados brasileiros) estão agrupadas em regiões e são vinculadas aos Tribunais Regionais Federais, que são a segunda instância da Justiça Federal.

Existem 6 Tribunais Regionais Federais (TRFs), cada qual com sua respectiva sede, que abarcam as  Seções Judiciárias conforme tabela abaixo:

Tribunal Regional Federal (TRF)Estados abarcadosCidade Sede
TRF 1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região)AcreAmazonasRoraimaRondôniaAmapáParáMato GrossoTocantinsMaranhãoPiauíBahiaGoiásDistrito FederalBrasília (DF)
TRF 2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região)Rio de Janeiro
Espírito Santo
Rio de Janeiro (RJ)
TRF 3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região)São Paulo
Mato Grosso do Sul
São Paulo (SP)
TRF 4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região)ParanáSanta CatarinaRio Grande do SulPorto Alegre (RS)
TRF 5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região)Rio Grande do NorteParaíbaCearáPernambucoAlagoasSergipeRecife (PE)
TRF 6 (Tribunal Regional Federal da 6ª Região)Minas GeraisBelo Horizonte (MG)

Qual a competência da Justiça Federal, do art. 109 CF?

A competência da Justiça Federal de primeira instância está definida no art. 109 da Constituição, mas podemos sumarizar a competência da Justiça Federal da seguinte forma:

Competência Cível da Justiça Federal

Aos juízes federais compete processar e julgar:

  1. Os processos em que sejam autores, réus, assistentes ou opoentes, a União, as autarquias federais e as empresas públicas federais;
  2. As causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no país;
  3. Os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridades federais;
  4. As causas cíveis nas matérias de nacionalidade, naturalização, direitos indígenas, bem como as fundadas em tratados e contratos da União com Estados Estrangeiros ou Organismos Internacionais e, mais recentemente, as causas onde haja grave violação de direitos humanos.

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Competência Criminal da Justiça Federal

São crimes de competência da Justiça Federal:

  1. Os cometidos contra bens, serviços e interesses da União;
  2. Os previstos em tratados internacionais;
  3. Aqueles em que tenha ocorrido grave violação de direitos humanos;
  4. Os cometidos contra a organização do trabalho;
  5. Os cometidos contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, nos casos previstos em lei;
  6. Os cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvados os crimes militares;
  7. Os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro.

No entanto, para uma análise mais completa da competência da Justiça Federal, é necessário passar pelo art. 109 da CF de forma detida e cuidadosa.

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Análise detalhada do art. 109, CF

Para analisar a questão, transcrevemos, na íntegra, o art. 109 da CF/88, ao qual adicionamos nossos comentários de estudo pertinentes à compreensão da matéria:

Art. 109 – Aos juízes federais compete processar e julgar:

I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; (destaques nossos)

  • Súmula 556, do STF: “É competente a Justiça comum para julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista.” (destaques nossos)
  • Súmula 508: “Compete à Justiça estadual, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas em que for parte o Banco do Brasil S.A.”
  • Súmula 501: “Compete à Justiça ordinária estadual o processo e o julgamento, em ambas as instâncias, das causas de acidente do trabalho, ainda que promovidas contra a União, suas autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista.”
  • O STF firmou sua jurisprudência no sentido de que, quando o INSS figurar como parte ou tiver interesse na matéria, a competência é da Justiça Federal. [RE 545.199 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 24-11-2009, 2ª T, DJE de 18-12-2009.] Vide RE 461.005, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 8-4-2008, 1ª T, DJE de 9-5-2008
  • Reclamação. Contrato temporário. Regime jurídico administrativo. Descumprimento da ADI 3.395. Competência da Justiça Federal. Contrato firmado entre a Anatel [Agência Nacional de Telecomunição] e a interessada tem natureza jurídica temporária e submete-se ao regime jurídico administrativo, nos moldes da Lei 8.745/1993; do inciso XXIII do art. 19 da Lei 9.472/1997 e do Decreto 2.424/1997. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o poder público e servidores que lhe sejam vinculados por relação jurídico-administrativa. Precedentes. Reclamação julgada procedente. [Rcl 4.762, rel. min. Cármen Lúcia, j. 2-3-2007, 1ª T, DJ de 23-3-2007.] = Rcl 5.171, rel. min. Cármen Lúcia, j. 21-8-2008, P, DJE de 3-10-2008

II – as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País;

  • Atrai a competência da Justiça Federal a natureza transnacional do delito ambiental de exportação de animais silvestres, nos termos do art. 109, IV, da CF/1988. [RE 835.558, rel. min. Luiz Fux, j. 9-2-2017, P, DJE de 8-8-2017, Tema 648.]
  • Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de tráfico internacional de drogas. Entretanto, nem o simples fato de alguns corréus serem estrangeiros nem a eventual origem externa da droga são motivos suficientes para o deslocamento da competência para a Justiça Federal.
    [HC 103.945, rel. min. Dias Toffoli, j. 26-4-2011, 1ª T, DJE de 6-6-2011.]

III – as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;

IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

  • Juntas comerciais. Órgãos administrativamente subordinados ao Estado, mas tecnicamente à autoridade federal, como elementos do sistema nacional dos Serviços de Registro do Comércio. Consequente competência da Justiça Federal para o julgamento de mandado de segurança contra ato do presidente da junta, compreendido em sua atividade-fim 
  • [RE 199.793, rel. min. Octavio Gallotti, j. 4-4-2000, 1ª T, DJ de 18-8-2000.]

V – os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

V–A –  as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo;

  • Incluído pela EC 45/2004

VI – os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;

  • São os crimes contra a organização do trabalho:
    • Atentado contra a liberdade de trabalho
    • Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta
    • Atentado contra a liberdade de associação
    • Paralisação de trabalho, seguida de violência ou perturbação da ordem
    • Paralisação de trabalho de interesse coletivo
    • Invasão de estabelecimento industrial, comercial ou agrícola. Sabotagem
    • Frustração de direito assegurado por lei trabalhista
    • Frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho
    • Exercício de atividade com infração de decisão administrativa
    • Aliciamento para o fim de emigração
    • Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional
  • Os crimes contra o sistema financeiro nacional estão descritos, tipificados e detalhados na LEI No 7.492, DE 16 DE JUNHO DE 1986.
  • Por sua vez, a LEI Nº 8.137, DE 27 DE DEZEMBRO DE 1990 define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo.

VII – os “habeas-corpus”, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;

  • O habeas-corpus é um remédio constitucional para garantir a liberdade de alguém, quando a pessoa for presa ilegalmente ou tiver sua liberdade ameaçada por abuso de poder ou ato ilegal.

VIII – os mandados de segurança e os “habeas-data” contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;

  • O habeas-data, por sua vez, é um instrumento processual constitucional que possui por escopo autorizar o impetrante a acessar seus dados pessoais sob posse do poder público.

IX – os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;

X – os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o “exequatur”, e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

  • Nacionalidade: Vínculo político-jurídico que liga precipuamente o indivíduo ao Estado. Sendo a nacionalidade um vínculo formal, ela se conecta ao conceito de Estado, sendo, portanto, eminentemente de interesse da União, o que justifica a atração da competência federal;
  • A nacionalidade secundária é aquela que se origina de um ato jurídico e voluntário denominado de naturalização. A naturalização é uma nacionalidade adquirida por meio de manifestação de vontade diante do preenchimento dos requisitos legais  O ato formal é CONSTITUTIVO do vínculo de nacionalidade.
  • O exequatur, por sua vez, é uma autorização concedida pelo STJ para que uma sentença estrangeira ou um pedido de autoridade estrangeira sejam executados no Brasil. Este pedido é formulado por carta rogatória.

XI – a disputa sobre direitos indígenas.

  • A Constituição de 88, no artigo 231, estabelece que cabe à União zelar pela proteção das terras e dos direitos dos índios no Brasil. Por este motivo, a competência federal é atraída para as causas que envolvam os direitos fundamentais dos povos originários.
  • A Justiça Federal só será competente quando o processo envolver a efetiva disputa de interesses indígenas. Na hipótese de crime em que o indígena for autor ou vítima, o caso deverá ser julgado pela Justiça estadual, conforme definiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao editar a Súmula 140.

§ 1º – As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio a outra parte.

  • O objetivo deste dispositivo é facilitar a consolidação processual e o desenvolvimento da ampla defesa do réu, ao admitir que a União possui mais condições de operar de forma ampla em território nacional do que o jurisdicionado, seja pessoa física ou jurídica.

§ 2º – As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

§ 3º – Serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça estadual.

§ 4º – Na hipótese do parágrafo anterior, o recurso cabível será sempre para o Tribunal Regional Federal na área de jurisdição do juiz de primeiro grau.

§ 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal.

  • O presente inciso foi incluído com o objetivo de federalizar o tratamento das graves violações de direitos humanos, trazendo mais seriedade e amplitude a seu tratamento, considerando, inclusive, o compromisso brasileiro enquanto Estado assumido na assinatura dos tratados protetivos. 

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Quem Investiga crimes federais?

De acordo com o art. 144 da Constituição Federal, a Polícia Federal é responsável pela investigação dos crimes que são de competência da Justiça Federal.

No entanto, investiga também outros delitos que não são de competência da Justiça Federal, como operações contra tráfico de drogas, armas, contrabando e combate a crimes financeiros. Tal atribuição é definida pela Lei 10.446/2002, que foi alterada pela lei 13.124/2015.

Estabelece tal legislação que, havendo repercussão interestadual ou internacional que exija repressão uniforme, poderá o Departamento de Polícia Federal do Ministério da Justiça, sem prejuízo da responsabilidade das Policiais civis e militares, proceder a investigação, dentre outras, das seguintes infrações penais:

I – sequestro, cárcere privado e extorsão mediante sequestro (arts. 148 e 159 do Código Penal), se o agente foi impelido por motivação política ou quando praticado em razão da função pública exercida pela vítima;

II – formação de cartel (incisos I, a, II, III e VII do art. 4º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990); 

III – relativas à violação a direitos humanos, que a República Federativa do Brasil se comprometeu a reprimir em decorrência de tratados internacionais de que seja parte;

IV – furto, roubo ou receptação de cargas, inclusive bens e valores, transportadas em operação interestadual ou internacional, quando houver indícios da atuação de quadrilha ou bando em mais de um Estado da Federação.

V – falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais e venda, inclusive pela internet, depósito ou distribuição do produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado (art. 273 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal). (Incluído pela Lei nº 12.894, de 2013)

VI – furto, roubo ou dano contra instituições financeiras, incluindo agências bancárias ou caixas eletrônicos, quando houver indícios da atuação de associação criminosa em mais de um Estado da Federação.

Para finalizar, a lei também prevê que o Departamento de Polícia Federal procederá à apuração de outros casos, desde que tal providência seja autorizada ou determinada pelo Ministro de Estado da Justiça.

Esperamos que este conteúdo detalhando o art. 109 CF tenha sido útil para você. Continue em nosso blog! Aproveite para conferir o nosso guia completo sobre a carreira de juiz

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